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Opinião: A Copa do Mundo deveria acontecer no Qatar?

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Foto: Almumtazza/ Freepik

Por Janaina Ramon*

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Com o início da Copa do Mundo diversas questões tornadas públicas sobre o país-sede levaram a um acúmulo de críticas internacionais, nela incluídas as más condições de trabalho a que foram submetidos os trabalhadores para a entrega do evento e as leis machistas e lgbtmaisfóbicas culturalmente presentes. Essas colocações nos levam a questionar: a Copa do Mundo deveria acontecer no Qatar?

Nos parece que não.

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O goleiro da seleção francesa Hugo Lloris, ao recusar o uso da braçadeira de capitão com as cores do arco-íris símbolo da comunidade LGBTQIAPN+, medida buscada por diversas seleções europeias em protesto ao tratamento dado em face destes, afirmou que o fazia buscando “respeitar as regras e a cultura de um país”.

Devolvemos em resposta: regras e culturas de um país, mesmo soberano, podem prevalecer sobre regras universais de direitos humanos quando abertas as portas para um evento mundial? Tudo bem definir que pessoas lgbtmais têm de fato compreensão porque sofrem de “danos mentais”, mas desde que se “comportem”? O goleiro se recusaria a ajudar uma mulher apanhando na sua frente porque a lei da região permite o ato por “guardiões masculinos”? É certo o “sistema kafala” (apadrinhamento no país de estrangeiros pelo empregador, que passa a dominar seu modo de vida) escravizar trabalhadores, incluído aí o jogador de futebol Zahir Belounis, cuja profissão é similar à do goleiro? Quando afeta seu mundo, passa a fazer diferença tais regras e culturas?

A análise não compete de fato ao goleiro, mas a FIFA (Fédération International de Football Association). Levar um evento do porte de uma Copa do Mundo deveria exigir uma análise pormenorizada do país a recepcioná-la e a FIFA certamente não fez o dever de casa. Ninguém quer dizer que todos os outros países são perfeitos, ou mesmo que não é possível que certas políticas sejam deixadas de lado pelo todo, mas desde que não envolvam direitos humanos basilares.

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Inclusive, a manifestação institucional da Federação de que a bandeira do orgulho gay (há diversas bandeiras na comunidade, mas essa é a mais utilizada) poderia ser usada em estádios quando o major-general qatari, Abdulaziz Abdullah Al Ansari, disse que as tomaria para garantir a segurança da própria comunidade para que não sofressem violência, gera mais insegurança do que certezas.

Compete então ao “dono da bola”, ou seja, a FIFA, escolher jogar em ambiente mais próximo possível de acolhimento de todas as pessoas e formas de existência, independentemente de gênero, raça, orientação sexual e outros itens diferenciadores, não só para dar exemplo a outras competições, caso das Olimpíadas, por exemplo, como para deixar claro que direitos humanos são inegociáveis e sua força pode sim gerar impacto num mundo mais inclusivo.

Quem sabe na próxima Copa…

advogada trabalhista janaina ramon (1)
Janaina Ramon, advogada de Crivelli Advogados

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*Janaina Ramon é advogada e integrante do grupo de trabalho e estudos GTE – Diversidades Crivelli