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Opinião – No apagar das luzes de 2018

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Por Maria José Soares Bonettii - advogada militante; professora de graduação e pós-graduação em Direito Tributário; mestre em Direito Tributário pela PUC/SP

O Texto Constitucional em vigor, extraído da vontade, da consciência e da cultura nacional, que representa o Estatuto do Estado Democrático de Direito, é obra legislativa de primeira grandeza, em vigor há trinta anos, sendo, portanto, o diploma das diretrizes maiores da conduta dos cidadãos e das instituições que compõem a nação brasileira. Desrespeitá-la, significa ignorar a própria razão de ser do Brasil.

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Ela está em vias de ser desrespeitada, e pasmem, por aqueles que lhe deram origem, de um lado, e de outro, por aqueles que têm a soberana incumbência de fazê-la valer. Basta que o Presidente da República, que por coincidência é professor de Direito Constitucional, também ignore o seu comando.

 O artigo 169 da Carta da República estabelece que “A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar”. A Lei Complementar a que se refere o artigo 169, é a Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF (Lei Complementar n° 101, de 04 de maio de 2000), cujo artigo 21, parágrafo único, dispõe que “ … é nulo de pleno direito o ato de que resulte aumento da despesa com pessoal, expedido nos cento e oitenta dias anteriores ao final do mandato do titular do respectivo Poder ou órgão referido no art. 20.”

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Talvez o Senado Federal, em razão da grande diversidade cultural dos seus componentes, não tenha se apercebido dos comandos normativos a que nos referimos. Porém, o ilustre Presidente da Corte Excelsa não poderia, jamais, demonstrar o mesmo desconhecimento, ao afirmar que o aumento de 16% nos seus próprios vencimentos está em consonância com a lei.

E o mesmo há que se dizer em relação ao ilustre Presidente da República, porquanto, em razão da sua formação jurídica de doutor em Direito Constitucional, jamais poderá sancionar a lei que estabelece referido aumento, posto a existência de regra jurídica proibitiva de jaez constitucional.

O Presidente da República está proibido de sancionar a norma irresponsavelmente aprovada pelo Senado Federal, com a aquiescência de Sua Excelência, o Presidente do Supremo Tribunal Federal.

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Não se está aqui a tratar do direito, ou não, à majoração dos vencimentos. Não se está aqui a tratar do impacto que esse aumento produzirá no carcomido orçamento público. Não se está aqui a tratar da (i)moralidade da medida, produzida no apagar das luzes de um mandato presidencial totalmente desastroso e que tanto atraso trouxe para a “Ordem e Progresso”.

O modesto comentário centra-se unicamente na manifesta inconstitucionalidade que está por se desterrar no apagar das luzes do mandato do governo federal. Esse governo, por ordem mandamental emanada da Constituição Federal, está proibido de sancionar o aumento do salário dos nobres Ministros do Supremo Tribunal Federal, e, por decorrência, dos demais interessados na medida.

A Lei de Responsabilidade Fiscal, como amplamente divulgado, foi editada em momento já bastante difícil da economia e da administração pública federal.

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Na época, inclusive, quase todos os mais de 5600 prefeitos municipais ficaram em polvorosa, pois fosse aplicada na sua plenitude, imediatamente, a norma emanada da referida lei complementar, muitos teriam sido presos, tamanha a rigidez do comando.

Essa lei, pensava-se, iria moralizar os gastos com pessoal da administração pública nos três níveis de governo. Mas, infelizmente, nesse quadrante, a norma constituiu tábula rasa, chegando ao ponto, hoje, de ser ignorada até mesmo pelo Presidente da Corte Suprema.

Um abaixo-assinado com mais de dois milhões e quinhentas mil assinaturas está em curso, para clamar ao Presidente da República que não sancione a indigitada lei que, absurdamente, onerará o Erário Federal com algo em torno de cinco bilhões de reais no gasto com a folha de salários dos exercentes de cargo público, como amplamente divulgado pela imprensa.

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A questão, como se verifica, é simples e não reclama maiores reflexões ou considerações, uma vez que, repita-se, o atual Presidente da República está proibido de promover a majoração dos salários, como pretendido, por força de disposição constitucional e legal.

Fazendo-o, a despeito da lei, tratando-se de ato nulo, caberá aos órgãos competentes, como o Ministério Público Federal ou a própria OAB, por exemplo, requerer a sua anulação.

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